A importância do fator da informação em ambientes virtuais da atualidade
O trabalho relativamente novo (2013) do consagrado geógrafo Milton Santos traz consistentes reflexões sobre o processo da globalização, tratando do modo como ela tem sido produzida, da perversidade que envolve a tirania da informação e do dinheiro, que resulta em competitividade desprovida de compaixão, em consumo aliado a seu despotismo e na confusão dos espíritos, dentre outros termos empregados pelo autor com precisão cirúrgica, como não poderia ser diferente, já que discursou com autoridade e desprezou o cumprimento de certas obrigações acadêmicas rituais ou, em suas palavras, dispensou o “cerimonial de referências”.
Não obstante, em meio a suas críticas ferozes aos atores sociais que a produzem na perversidade, apresenta uma possibilidade efetiva de construção de um outro mundo, através de uma globalização humanizada, pois argumenta que no cenário atual há bases materiais como a unicidade da técnica, a convergência dos momentos (o conhecimento do “outro” que, em ambientes virtuais, verifica-se principalmente nas redes sociais) e o conhecimento do planeta. No plano empírico, sustenta o autor, há fatos indicativos da emergência de uma nova história: observa-se enorme mistura de povos, raças, culturas e gostos em todos os continentes; e, graças aos progressos da informação, tem-se uma maior gama de filosofias, não mais estando o racionalismo europeu no centro.
Todavia, observados esses fatos e ainda encontrando-se a humanidade em um período técnico-científico tal que é possível produzir materiais em laboratório como verdadeiros frutos da inteligência humana, capaz de conceber com precisão os materiais antes de sua elaboração, a dupla tirania supramencionada do dinheiro e da informação continuam demasiado poderosas, criando enganos como a “aldeia global“, a aparente ideia de que a sociedade está razoavelmente informada e um novo ethos, ou seja, um novo conjunto de costumes fortemente influenciado pela competitividade, sugerida pela produção e pelo consumo em seus aspectos negativos, o que torna-se fonte de novos totalitarismos.
Pode-se perguntar: qual o verdadeiro peso desses fatores? O que se dizer precisamente sobre o fator da informação? Há realmente possibilidade de totalitarismos vindos de atores sociais que detêm enorme poder?
Para não estender aquilo que não se propõe a ser uma exposição cabal a respeito do assunto, mas antes um breve estudo que suscita reflexões e perguntas, pode-se verificar quão sérias são suas preocupações relativas à informação no contexto da iminente web 4.0, por exemplo — caracterizada pelo escritor e orador de negócios americano Seth Godin em 2007 como um ambiente que envolve um cliente de e-mail inteligente a respeito do que o usuário e sua rede de colegas fazem, o uso daquilo que se conhece hoje como smartphone, um processador de textos que relaciona o que o usuário escreve ao que consta na web de informações a respeito e redes que eliminem o anonimato onde quer que se esteja[2] — , no qual não faltam casos de gigantes das redes sociais que exercem tal tirania descrita pelo geógrafo, a ponto de muitas vezes a própria crítica especializada corrente ser incapaz de acompanhar e descrever.
Esta, as mais das vezes, limita-se apenas a relatar o aumento das funcionalidades, ano após ano, que concorrem para uma realíssima interatividade que aparenta tornar as pessoas cada vez mais próximas através de tecnologias novas, mas pouco aprofunda-se em demonstrar como a utilização de informações dos usuários para gerar publicidade vem sendo prática usual das redes sociais de maneira pouco transparente, o que tem sido objeto de estudo apenas de reduzido número de pesquisadores sobre segurança on-line, como se vê na matéria da Ana Luiza Tieghi para a revista Espaço Aberto[3].
Santos explica que um dado essencial a respeito do consumo é que a produção do consumidor, hoje, precede à produção dos bens e serviços; vê-se que esta explicação é exata quando se examina as práticas invasivas das gigantes redes sociais, para não citar as empresas menores que espelham-se nas redes sociais quanto a forma de conhecer os hábitos dos consumidores; posto isto, invevitavelmente percebe-se que o fator da informação, além do dinheiro que quase sempre relaciona-se a ele, exige uma visão supraempreendedora ao estudioso mais sério dos caminhos do empreendedorismo, vez que nem sempre encontra em seu campo tais preocupações que não faltam a um cientista social ou a pesquisadores da tecnologia com sérias preocupações éticas.
Vale então nesse cenário, aos dispostos ao exame mais grave, mais conhecimento, reflexões e questionamentos sobre como as informações têm sido usadas nas empresas, pequenas ou grandes, a fim de tornar claro se elas têm servido à construção de um outro mundo em que se vê humanização ou apenas a um aumento de competitividade através da produção de consumidores de forma demasiadamente antiética.
Referências:
1. SANTOS, Milton. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal. 23. ed. Rio de Janeiro: Record, 2013. 174 p. ISBN 978–85–01–05878–2.
2. GODIN, Seth. Web 4. Seth’s Blog, 19 de janeiro de 2007. Disponível em: <http://sethgodin.typepad.com/seths_blog/2007/01/web4.html>. Acesso em: mai/18.
3. TIEGHI, Ana Luiza. Existe privacidade no mundo virtual?. Revista Espaço Aberto USP, edição 159 — abril 2014 — ano XIII. Disponível em: <http://www.usp.br/espacoaberto/?materia=existe-privacidade-no-mundo-virtual-2>. Acesso em: mai/18.